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 Sala dos Doutrinadores - Ensaios Jurídicos
Autoria:

Gisele Amorim Zwicker
Estudante do 10º semestre da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

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Monografias Direito Constitucional

APLICABILIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS E A CLASSIFICAÇÃO DE CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO

O artigo apresenta, inicialmente, a relação contida entre a tradicional classificação sobre a eficácia das normas constitucionais e aquela proposta por Celso Antônio Bandeira de Mello, com o intuito de demonstrar a maior adequação da última.

Texto enviado ao JurisWay em 09/10/2013.

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Sumário: I – Introdução; II – Aplicabilidade e Eficácia Constitucional; III – As Classificações Usuais; IV – Classificações Decorrentes; V - A Proposição de Celso Antônio Bandeira de Mello VI – A Classificação de Celso Antônio Bandeira de Mello; VII – A Finalidade do Direito; VIII - Conclusão.

 

I – Introdução

A aplicação das normas inseridas na Lex Mater é de suma importância, pois a Constituição Federal não é mera norma de Direito, mas o fundamento que lhe dá coerência e é o sustentáculo lógico-normativo de todo o ordenamento jurídico infraconstitucional. Contudo, por estes mesmos motivos, e pela destacada relevância de sua função, pretende-se, sem a ambição de exaurimento do tema, demonstrar a necessidade de conferir cunho mais pragmático ao estudo da eficácia normativa constitucional, aplicável que é a lei, primordial e, finalisticamente, ao seu destinatário, o povo, o administrado, aquele efetivamente tutelado pelo Direito.

 

II – Aplicabilidade e Eficácia Constitucional

Servindo-nos de introdução ao tema, valemo-nos da brilhante lição de Uadi Lammêgo Bulos, que, com precisão, discorre sobre a aplicabilidade constitucional. Segundo referido autor, aplicabilidade constitucional “é a capacidade de uma norma da constituição produzir efeitos jurídicos. A norma constitucional só é aplicável na medida em que for eficaz”. (BULOS, Uadi Lammêgo, Direito Constitucional ao Alcance de Todos, 2ª ed, São Paulo: Saraiva, 2010, p.142).

Por isso, aplicabilidade e eficácia constitucionais são fenômenos conexos:

a) Aplicabilidade constitucional = realizabilidade = incidência das constituições; e

b) Eficácia constitucional = potencialidade = capacidade das constituições de gerarem efeitos.

Com fulcro no escólio de José Afonso da Silva, afirma-se que a norma só é aplicável na medida em que for eficaz. Isto é, a eficácia e a aplicabilidade das normas contidas na Carta Magna são fenômenos conexos, “aspectos talvez do mesmo fenômeno, encarados por prismas diferentes: aquela como potencialidade; esta como realizabilidade, praticidade” (SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. 7ª edição, São Paulo: Malheiros, 2007)

Na lição de Pedro Lenza, “todas as normas apresentam eficácia, algumas jurídica e social e outras apenas jurídica (LENZA, Pedro. Curso de Direito Constitucional Esquematizado. 15ª edição. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 199). Passa-se, então, à análise da mais adotada classificação dos preceptivos constitucionais, utilizado inclusive pelo Pretório Excelso.

 

III – As Classificações Usuais

Trata-se, em suma, da tradicional classificação das normas constitucionais de José Afonso da Silva, retirada de sua monografia intitulada “Aplicabilidade das Normas Constitucionais” onde o jurista da Faculdade das Arcadas explorou exaustivamente o tema, tecendo críticas a fundo sobre diversos critérios classificatórios até fixar-se na conclusão, relativa às normas constitucionais, vistas pelo aspecto de sua eficácia e aplicabilidade. De que se constituem em normas de eficácia plena, contida e limitada. Temos por ela o seguinte:

Normas de eficácia plena: aquelas que, desde a entrada em vigor da Constituição, produzem, ou têm possibilidade de produzir, todos os efeitos essenciais, relativamente aos interesses, comportamentos e situações, que o legislador constituinte, direta e normativamente, quis regular. Como exemplo, podemos citar os “remédios constitucionais”.

Normas constitucionais de eficácia contida: são aquelas que o legislador constituinte regulou suficientemente os interesses relativos a determinada matéria, mas deixou margem à atuação restritiva por parte da competência discricionária do poder público, nos termos que a lei estabelecer ou nos termos de conceitos gerais nelas enunciados. Para exemplificar, destaca-se a norma contida na Lex Mater, art. 5º, XIII, que assim dispõe: “é livre o exercício de qualquer trabalho , ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”.

Há, por último, nesta clássica lição de José Afonso da Silva, as normas constitucionais de eficácia limitada, que são aquelas que apresentam “aplicabilidade indireta, mediata e reduzida, porque somente incidem totalmente sobre esses interesses, após uma normatividade ulterior que lhes desenvolva a aplicabilidade”.

Assim, para aclarar o conceito, traz-se de exemplo o disposto no art. 37, VII da Constituição de 1988: “o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica”. Essa previsão, como se vê, condiciona o exercício do direito de greve, no serviço público, à regulamentação legal. Cita-se, ainda, a título de exemplo, o contido no art. 7º, XI, da mesma Constituição, que prevê a participação dos empregados nos lucros, ou resultados da empresa, conforme definido em lei.

Isto é, para ilustrar e melhor compreender a classificação do referido mestre, pode-se dizer, grosso modo, que a Constituição Federal traz normas:

1-               De eficácia plena, que possuem eficácia é absoluta.

2-               De eficácia contida, ou seja, eficácia relativa restringível.

3-               De eficácia limitada, ou seja, eficácia relativa dependente de complementação legislativa.

 

É esta a classificação mais utilizada no cotidiano. Didaticamente, a de maior profusão e apreço, comumente encontrada em concursos públicos, textos acadêmicos e a mais difundida em obras doutrinárias.

É utilizada, por exemplo, no Pretório Excelso, como se vê da transcrita ementa de acórdão:

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO - PENSÃO POR MORTE DO SERVIDOR PÚBLICO - CF, ART. 40, § 5º - AUTO-APLICABILIDADE - RE CONHECIDO E PROVIDO. - A garantia jurídico-previdenciária outorgada pelo art. 40, § 5º, da Carta Federal deriva de norma provida de eficácia plena e revestida de aplicabilidade direta, imediata e integral. Esse preceito da Lei Fundamental qualifica-se como estrutura jurídica dotada de suficiente densidade normativa, a tornar prescindível qualquer mediação legislativa concretizadora do comando nele positivado. Precedentes. - O valor da pensão por morte, que deve corresponder à totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido, está sujeito, unicamente, ao limite a que se refere ao art. 37, XI, da Constituição Federal”. (RE 175349 / SP - SÃO PAULO
RECURSO EXTRAORDINÁRIO Relator(a):  Min. CELSO DE MELLO
Julgamento:  25/02/1997. Órgão Julgador:  Primeira Turma, Supremo Tribunal Federal)

 

IV – Classificações Decorrentes

Posteriormente, e com base na obra de José Afonso da Silva, Maria Helena Diniz propõe uma nova espécie de classificação das normas constitucionais, com ligeira semelhança, tendo por critério a intangibilidade e a produção dos efeitos concretos (DINIZ, Maria Helena. Norma Constitucional e seus efeitos. 2ª edição. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 98-103).

Assim, propõe e explica que são normas constitucionais de eficácia absoluta as intangíveis; contra elas nem mesmo há o poder de emendar. Daí conterem uma força paralisante total de toda a legislação que, explícita ou implicitamente, vier a contrariá-las. Distinguem-se, portanto, das normas constitucionais de eficácia plena, que, apesar de incidirem imediatamente sem necessidade de legislação complementar posterior, são emendáveis. Por exemplo, os textos constitucionais que amparam a federação (art. 1º), o voto direto, secreto, universal e periódico (art. 14), a separação de poderes (art. 2º) e os direitos e garantias individuais (art. 5º, I a LXXVII), por serem insuscetíveis de emenda são intangíveis, por força dos arts. 60, §4º, e 34, VII, a e b.

As normas com eficácia plena são plenamente eficazes, desde sua entrada em vigor, para disciplinarem as relações jurídicas ou o processo de sua efetivação, por conterem todos os elementos imprescindíveis para que haja a possibilidade da produção imediata dos efeitos previstos, já que, apesar de suscetíveis de emenda, não requerem normação subconstitucional subseqüente. Podem ser imediatamente aplicadas.

Por seu turno, correspondem as normas com eficácia relativa restringível às de eficácia contida de José Afonso da Silva, mas, aceitando a lição de Michel Temer, preferimos denominá-la normas constitucionais de eficácia redutível ou restringível, por serem de aplicabilidade imediata ou plena, embora sua eficácia possa ser reduzida, restringida nos casos e na forma que a lei estabelecer; têm, portanto, seu alcance reduzido pela atividade legislativa. São preceitos constitucionais que receberam do constituinte normatividade capaz de reger os interesses, mas contêm, em seu bojo, a prescrição de meios normativos ou de conceitos que restringem a produção de seus efeitos. São normas passíveis de restrição.

Por último, há preceitos constitucionais que têm aplicação mediata, por dependerem de norma posterior, ou seja, de lei complementar ou ordinária, que lhes desenvolva a eficácia, permitindo o exercício do direito ou do benefício consagrado. Sua possibilidade de produzir efeitos é mediata, pois, enquanto não for promulgada aquela lei complementar ou ordinária, não produzirão efeitos positivos, mas terão eficácia paralisante de efeitos de normas precedentes incompatíveis e impeditiva de qualquer conduta contrária ao que estabelecerem. Não recebem, portanto, do constituinte normatividade suficiente para sua aplicação imediata, porque ele deixou ao Legislativo a tarefa de regulamentar a matéria, logo, por esta razão, não poderão produzir os seus efeitos de imediato, porém têm aplicabilidade mediata, já que incidirão totalmente sobre os interesses tutelados, após o regramento infraconstitucional. Por esse motivo, preferimos denominá-las normas com eficácia relativa dependente de complementação legislativa.

Digna de nota, ainda, a teoria proposta por Manoel Gonçalves Ferreira Filho, que, pautada nos mesmo preceitos, expressa-se da seguinte maneira:

1.       Normas auto-executáveis: são aquelas que, sendo completas e definidas quanto à hipótese e à disposição, bastam por si mesmas e assim podem e devem ser aplicadas de imediato. Tem aplicabilidade imediata.”

2.       Normas não-auto-executáveis: são aquelas que não podem ter aplicação imediata, porque dependem de regra ulterior que as complemente...Não tem aplicabilidade imediata” e são de três espécies:

a)     normas incompletas – aquelas que não são suficientemente definidas, vg. As “que criam institutos processuais mas não esclarecem qual o procedimento aplicável”;

b)    normas condicionadas - “aquelas que, embora pareçam suficientemente definidas na hipótese e no dispositivo, foram condicionadas pelo constituinte a uma lei posterior, que precise os seus elementos integrantes”;

c)     normas programáticas, “as que indicam planos ou programas de atuação governamental. Estas não só reclamam lei ordinária de complementação ou regulamentação, mas também exigem medidas administrativas, para que possam tornar-se efetivas.”

 

As normas programáticas, conforme salienta Jorge Miranda, são de aplicação diferida, e não de aplicação ou execução imediata; mais do que comandos-regras, explicitam comandos-valores; conferem elasticidade ao ordenamento constitucional; têm como destinatário primacial – embora não único – o legislador, a cuja opção fica a ponderação do tempo e dos meios em que vêm a ser revestidas de plena eficácia (e nisso consiste a discricionariedade); não consentem que os cidadãos ou quaisquer cidadãos as invoquem já (ou imediatamente após a entrada em vigor da Constituição), pedindo aos tribunais o seu cumprimento só por si, pelo que pode haver quem afirme que os direitos que delas constam, máxime os direitos sociais, têm mais natureza de expectativas que de verdadeiros direitos subjetivos; aparecem muitas vezes, acompanhadas de conceitos indeterminados ou parcialmente indeterminados.

Assim, o juízo de oportunidade e a avaliação da extensão do programa incumbem ao Poder Legislativo, no exercício de sua função legiferante e, como salientado por Tercio Sampaio Ferraz Jr., “a eficácia técnica, neste caso, é limitada. E a eficácia social depende da própria evolução das situações de fato. Daí resulta uma aplicabilidade dependente”.

Maria Helena Diniz cita os artigos 21, IX, 23, 170, 205, 211, 215, 218, 226, §2º, da Constituição Federal de 1988 como exemplos de normas programáticas, por não regularem diretamente interesses ou direitos nelas consagrados, mas limitarem-se a traçar alguns preceitos a serem cumpridos pelo Poder Público, como “programas das respectivas atividades, pretendendo unicamente a consecução dos fins sociais pelo Estado”.

Como é possível inferir, em que pese divirjam as classificações supramencionadas, em razão do critério adotado por cada autor, o seu ponto base, fulcral, de onde emana a divisão transcrita é sempre a eficácia.

Na lição de Pedro Lenza, “todas as normas apresentam eficácia, algumas jurídica e social e outras apenas jurídica”. Valendo-se, em seguida, da lição de Michel Temer, assevera: “eficácia social se verifica na hipótese de a norma vigente, isto é, com potencialidade para regular determinadas relações, ser efetivamente aplicada a casos concretos. Eficácia jurídica, por sua vez, significa que a norma está apta a produzir efeitos na ocorrência de relações concretas; mas já produz efeitos jurídicos na medida em que a sua simples edição resulta na revogação de todas as normas anteriores que com ela conflitam”.

 

V – A Proposição de Celso Antônio Bandeira de Mello

De modo diverso, parte o professor Celso Antônio Bandeira de Mello de discrímen dessemelhante. Adota como critério para classificação a relação entre a norma constitucional e as distintas posições jurídicas em que os administrados se veem imediatamente investidos em decorrência delas.

Assevera a importância das classificações transcritas, que, como diz, de base serviram ao seu estudo, ainda incompleto. Desponta, então, que não pretende ofuscar aquelas classificações. De fato, em suas palavras: “Esta perquirição não coincide com o questionamento sobre a eficácia plena, contida ou limitada dos preceitos da Carta Maior. Também não se superpõe à análise relativa à auto-aplicabilidade das normas ou sua dependência de regramento ulterior. Outrossim, não confere com a identificação de normas restringíveis ou intangíveis. Todas estas investigações a que se acaba de aludir são, certamente, muitíssimo importantes. É provável mesmo que, no fundo, tenham como projeto implícito, subjacente, concorrerem também para captar resposta ao questionamento central referido, a saber: ‘Quais a tipologia e a consistência dos direitos diretamente dedutíveis das normas constitucionais, em prol dos administrados?’” (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Eficácia das Normas Constitucionais e Direito Sociais. 1ª edição, 3ª tiragem, São Paulo: Malheiros, 2011., p. 17).

Fica evidente o exposto pelo autor quando se percebe que, não obstante tenham eficácia plena, estas normas podem, em certos casos, conferir aos administrados posição jurídica mais débil. Diz o autor que esta espécie de normas tem a peculiaridade de “poder gerar tanto a posição jurídica mais forte para os cidadãos quanto a posição jurídica mais fraca”.

Elucidativamente tem-se a regra do art. 22, I da Constituição da República Federativa do Brasil, que assim dispõe:

“Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

        I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho.”

Cuida-se, in casu, de norma de eficácia plena, segundo a classificação de José Afonso da Silva. Contudo, ensina Celso Antônio, desta disposição constitucional nada colhe de direito o administrado; sabe-se que pode ser editada legislação, e que, caso feita, será pela União. Porém, aos cidadãos, de imediato não há qualquer utilidade ou benefício, tampouco podendo exigir a elaboração de lei. Na mesma esteira a norma do artigo 242, §2º da Carta de Outubro.

Ainda a título exemplificativo, contrapõe esta referida norma à insculpida no artigo 206, IV do Texto Constitucional, impositiva de gratuidade do ensino público nos estabelecimentos oficiais, regra também de eficácia plena. Dela se extrai que o administrado tem o direito de fruir desta gratuidade e de exigi-la, caso seja violada.

Vê-se, portanto, que duas normas de mesma tipologia – “eficácia plena” – geram posições jurídicas totalmente distintas.

Seguindo a esteira comparativa, explicita que a norma do artigo 5º, LVIII tem eficácia contida:

 “Art. 5º “omissis”:

   LVIII - o civilmente identificado não será submetido a identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei”.

Mas, em que pese tenha eficácia contida, quando inserida na classificação tradicional apontada, decerto confere ao administrado posição jurídica muito mais consistente que a supratranscrita regra de eficácia plena do art. 22, I da Constituição Federal, tratando-se de direito imediatamente passível de fruição e exigibilidade.

Assim, conclui certeiramente: “a disceptação entre normas de eficácia plena, contida ou limitada não é instrumento operativo para isolar os distintos teores de consistência da posição jurídica dos cidadãos ante as normas constitucionais”. Adota, portanto, spiritus rector diferente para sua sistematização.

 

VI – A Classificação de Celso Antônio Bandeira de Mello

Feitas as necessárias consideração acerca da motivação e o embasamento que fundamenta a classificação de Celso Antônio Bandeira de Mello, analisa-se ela mais minuciosamente.

Dispõe o aclamado professor que, em determinados momentos a Constituição:

1 – “Compõe em sua dicção a outorga de um ‘poder jurídico’ em sentido estrito, isto é, de uma situação subjetiva ativa cujo desfrute independe de uma prestação alheia – vale dizer, cuja satisfação não se resolve no cumprimento de uma obrigação a ser solvida por outrem”. Seria a atribuição, pelo texto constitucional, ao administrado, de Poder em sentido estrito, diferente do direito subjetivo. Conceitua-se por ser genérico, não tendo objetos determinado, ao passo que o direito subjetivo sempre está inserto em relação jurídica concreta e particular com determinada coisa ou dada pessoa com correlatas obrigações correspondentes.

A título elucidativo apresenta o direito de locomoção, o direito de inviolabilidade do domicílio, do direito de propriedade, do livre comércio, do direito à vida e à incolumidade física.

Como dito, independe de solvimento de obrigação alheia, necessitando somente de abstenção, isto é, omissão do Poder Público. Não se precisa de prestação positiva, mas da ausência de prestação negativa, inexistência de turbação ou embaraço.

Assim, criam posição jurídica imediata de plena consistência ao administrado, prescindindo de regramento ulterior, outorgando:

a)    “uma utilidade concreta, um desfrute positivo”;

b)    “a possibilidade de exigir esta utilidade se for embaraçada ou perturbada por outrem”.

2 – “Compõe em sua dicção o necessário e suficiente para gerar em prol do administrado concreta utilidade, suscetível de fruição mediante desfrute positivo e que consiste em um direito em sentido estrito, que é o direito propriamente dito, isto é, bem jurídico cuja fruição depende de uma prestação alheia”. Assim, distintamente da primeira hipótese, deve haver, para o desfrute do direito, relação jurídica com específico cumprimento obrigacional; neste ponto, necessária a ilustração da conduta exigível (geralmente estatal) pela norma constitucional. Ou seja, a norma “indica quem é o obrigado e caracteriza, de modo suficiente, a conduta devida cujo implemento satisfaz o direito concedido”.

Para elucidar o conceito, tome-se como exemplo o seguinte preceptivo:

“Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais.

        § 1º - O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental”.

Sua simples existência implica na garantia imediata do direito de fruição do ensino religioso e de exigir seja ele ministrado, caso os estabelecimentos se omitam, desnecessária regra posterior.

Contudo, pode a regra limitar-se a :

3 – “Expressar em sua dicção apenas uma finalidade a ser cumprida obrigatoriamente pelo Poder Público, sem, entretanto, apontar os meios a serem adotados para atingi-la, isto é, sem indicar as condutas específicas que satisfariam o bem jurídico consagrado na regra”. Percebe-se ictu oculi que a posição jurídica do administrado é menos consistente que nos casos anteriores, não lhes sendo conferida qualquer fruição, nem sendo-lhes permitido exigi-la. Como exemplo, tem-se o art. 226 e o art. 170, III, ambos da Constituição de 1988.

Sua finalidade consiste em permitir o administrado:

a)     oponha-se judicialmente ao cumprimento de regras ou à prática de comportamentos que o atinjam, se contrários ao sentido da Constituição.

b)    a obtenção, nas prestações jurisdicionais, de interpretação e decisão orientadas conforme estas normas constitucionais sob análise, sempre que em conformidade.

Feitos os esclarecimentos sobre os tipos de normas em relação à consistência dos direitos que delas procedem para os administrados, o Professor Celso Antônio Bandeira de Mello subdivide as normas outorgadoras de poderes-direitos e direito stricto sensu imediatamente fruíveis e exigíveis.

Os dois podem ser:

a)    “poderes-direitos ou direitos em sentido estrito insuscetíveis de restrição”;

b)    “poderes-direitos ou direitos em sentido estrito restringíveis por lei ordinária”.

Assim, estes direitos previsto na Lei Maior são imediatamente fruíveis e exigíveis, mas podem sofrer limitação em razão de posterior normatividade infraconstitucional, mas nunca sua supressão.

Dividir-se-iam, ainda, as normas que outorgam direitos suscetíveis de imediato desfrute e exigibilidade em:

a)     “normas que delimitam com exatidão o conteúdo do direito, porque a dicção constitucional se vale de expressões inelásticas, isto é, de significado preciso” (v.g., regra estatuída no art. 7º, XV);

b)    “normas que delimitam aproximativamente o conteúdo do direito, porque a dicção constitucional vale-se de expressões elásticas, isto é, de significado algo fluido, altamente impreciso” (e.g., a norma contida no art. 7º, XXXIII).

 

 

VII – A Finalidade do Direito

Surge, diante da proposta deste breve estudo, a necessidade da exposição da finalidade do Direito, isto é, a que se deve o Direito. Desta feita, tal conceituação aparece de modo incidental, não sendo nosso foco, mas é imprescindível sejam tecidos sucintos comentários acerca disso.

O Direito, seja como ordenamento jurídico, seja na forma de objeto da Ciência do Direito, tem como escopo servir para normatizar condutas. O que se diz é que as regras estabelecidas, denotadas por seu caráter impositivo e coercitivo, seja meramente prescritivo, contenha ou não sanção, têm como finalidade precípua a de estabelecer regras de convivência, permitindo, assim, maior equilíbrio no enlace humano.

Reitera-se a brevidade e simplicidade da conceituação acima exposta, desprovida que está de maior profundidade, servindo-nos apenas a amparar a conclusão.

 

 

VIII – Conclusão

Inegável que é o conteúdo do brocardo ubi societas, íbis ius; ubi ius, ibi societas, e certo que as regras do Direito são formuladas com intuito de estabelecer melhor convivência entre o homem, indaga-se porque não o estudo da norma tendo por parâmetro seu destinatário, o próprio homem.

De modo algum, neste momento, afasta-se ou pretende-se afastar o estudo da norma por ela mesma, em si própria, como brilhantemente feito por Hans Kelsen em sua magnum opus “Teoria Pura do Direito”, mas põe-se em pauta a necessidade de avaliação, conforme as necessidades, dos efeitos do regramento em relação à quem ela aproveita, ao próprio administrado. Diz-se, pois, que não basta a análise e acordo ao mundo do “dever-ser”, sendo, sob ótica prática, imprescindível o estudo da eficácia normativa quanto à efetiva geração de efeitos para os administrados, como agora estudado.

Conforme explicitado, tendo-se como base a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello, haveria que se emprestar maior pragmatismo ao estudo da norma, procurando dissecá-la teleologicamente. Amparado em método comparativo, aponta-se muito maior adequação da classificação proposta pelo Professor Celso Antônio Bandeira de Mello, mesmo que posterior e, como afirmado pelo autor, desprendida da teoria de José Afonso da Silva, à finalidade social do Direito, posto que, em análise última, inservível e inútil a norma sem seus efeitos esperados, e, mormente, prejudicial a regra cujos efeitos irradiam-se sem prestar-se úteis. A ineficácia da Constituição, em relação ao administrado, no tocante a não projetá-lo quaisquer direitos, torna-a, em certo modo, letra morta.

Destarte, o pretender de ser mais operativo para o exame da aplicação das normas constitucionais no concernente aos direito arguíveis pelos administrados, premissa básica da classificação da eficácia das normas constitucionais elaborada por Celso Antônio Bandeira de Mello, revela-se imprescindível, bastando o fato de servir, primeiramente, o Direito para a aplicação ao caso concreto. A análise da devida e esperada proteção aos administrados é indispensável.

Inolvidável, pois, esta lição que aqui se enaltece, tendo em vista sua aplicação prática, ao mesmo tempo não destituída do apego à ciência. É, então, a busca por um esquema diverso, mais funcional para os objetivos propostos, no caso a análise da norma e seu destinatário. Como assevera o próprio idealizador, cuida-se de “instrumento que tem a pretensão de ser útil, mas que se reconhece ainda tosco e exigente de reflexões”. Até porque “impende reconhecer que as disposições constitucionais balizadoras da ação do Estado são mecanismos prepostos a conter certos rumos estatais, em prol dos indivíduos, e a direcionar-lhe as condutas para certos rumos, em prol dos cidadãos. Donde serem eles mesmos, indivíduos, titulares de direitos” (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op cit., p. 47).

 

Referências Bibliográficas

 

BONAVIDES. Curso de Direito Constitucional. 19ª edição, São Paulo: Malheiros, 2006.

BULOS, Uadi Lammêgo, Direito Constitucional ao Alcance de Todos, 2ª ed, São Paulo: Saraiva, 2010.

DINIZ, Maria Helena. Norma Constitucional e seus efeitos. 2ª edição. São Paulo: Saraiva, 1992.

FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional, 29ª edição. São Paulo, Saraiva, 2002.

LENZA, Pedro. Curso de Direito Constitucional Esquematizado. 15ª edição. São Paulo: Saraiva, 2010.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Eficácia das Normas Constitucionais e Direito Sociais. 1ª edição, 3ª tiragem, São Paulo: Malheiros, 2011.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 27ª edição. São Paulo: Atlas, 2011.

NUNES, Rizzatto. Manual de Introdução ao Estudo do Direito. 10ª edição. São Paulo: Saraiva, 2011.

REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 27ª edição, 6ª tiragem. São Paulo: Saraiva, 2006.

SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. 7ª edição, São Paulo: Malheiros, 2007.

SUNDFELD, Carlos Ari. Fundamentos de Direito Público. 4ª edição, 2ª tiragem, São Paulo: Malheiros, 2001.

RE 175349/SP - SÃO PAULO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Relator:  Min. CELSO DE MELLO. Julgamento:  25/02/1997. Órgão Julgador:  Primeira Turma, Supremo Tribunal Federal. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28175349.NUME.+OU+175349.ACMS.%29&base=baseAcordaos

 

 

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